domingo, 31 de julho de 2011

Adeus, meu pé de cajamanga!!!


* Bueno
buenocantor@terra.com.br

“Quando a última árvore for derrubada, o último peixe for pescado e o último rio secar, o homem vai descobrir que dinheiro não se come.” Começo meu texto de hoje com esse ditado indígena. Dia desses, vendo noticiário na TV, observei um desolado casal de Jardinópolis, já aparentando estar na terceira idade, lamentando a derrubada de árvores frutíferas que plantaram ao longo da vida, como jabuticabeiras, acerolas e outras espécies. As imagens mostravam-nas caídas. O repórter perguntou à senhora o que ela iria fazer, e ela, com a calma que só a experiência de vida nos dá, respondeu que iria plantar tudo outra vez. E complementou: “Só que vai demorar trinta anos para chegar no ponto em que estavam”.
Noutro dia, vi também na TV, nossos homens do Corpo de Bombeiros capturando um cachorro do mato que, no desespero de não ter o que comer, deixou seu hábitat natural e invadiu uma casa em uma cidade próxima. Era uma casa simples e ele alojou-se num pequeno banheiro, estava muito magro, aparência de assustado e de quem estava sem comer sabe-se lá há quanto tempo. Disseram que ele seria devolvido ao local de onde veio, mas e daí????
O prédio da Secretaria Municipal da Cultura, onde trabalho, é um gigante de concreto, suas janelas enormes de vidro substituem paredes e, felizmente, nos proporcionam uma vista encantadora! Localizado no Morro do São Bento, bem próximo ao Bosque Municipal, temos a alegria de ver, diariamente, no entorno, adultos pés de sibipirunas, angicos, coqueiros e ipês, onde bandos e mais bandos de pequenos pássaros, principalmente piriquitinhos, fazem seus ninhos. De ninhada em ninhada, não deixam a espécie desaparecer. Mas onde tem filhotes tem também o famigerado gavião, predador nato tentando sobreviver aqui na cidade, e para tal vive rondando ninhos alheios. Estão sempre nas pontas das árvores, loucos para também matar sua fome, ficam só de butuca, esperando um descuido dos guardiões que fazem marcação serrada. E olha que ele tenta muito, mas recua, pois esse lindo exército verdinho se enche de valentia protegendo suas moradas.
Dia desses fomos agraciados pela visita de um maravilhoso tucano. Mas, achei estranho um tucano ali, seu comportamento um tanto que amistoso, foi até fotografado inúmeras vezes, voou de galho em galho, de janela em janela como se quisesse nos dizer: “Façam alguma coisa, estou aqui por não ter com o que me alimentar de onde venho, tiraram a minha mata, meus frutos e o pouco que restou está contaminado com o veneno que aviões jogam na cana e o vento se encarrega de espalhar”.
Escrevi um texto em 2010, e como acredito que nada acontece por acaso, nele conto o reencontro com meu pé de cajamanga 59 anos depois. Ele ficava no barranco do ribeirão Preto, que passava no fundo do quintal da minha casa, via seus frutos caírem, alguns na água, outros rolavam pelo barranco. Hoje o rio está sendo alargado numa tentativa de dar fim às enchentes.
 Neste local havia uma colônia de casas de ferroviários, meu pai era maquinista e eu fui criança ali. Em frente de casa passava a linha do trem, hoje é a avenida Caramuru. Em janeiro deste ano, estava viajando quando meu filho Paulo Bueno ligou, dizendo: “Pai!!! Derrubaram o seu pé de cajamanga, até fiz algumas fotos pra você guardar de lembrança”.
E eu que achava que ele seria preservado, não me perdoava por não estar ao seu lado na hora do adeus. Contava os minutos da minha volta na esperança de ainda vê-lo antes de ser removido, mesmo que abatido e na posição horizontal. Ele que por mais de cem anos, permanecera ali, quantos pássaros dele se alimentaram, sabe-se lá quantas crianças e adultos que protegidos pela sua grandiosa sombra saborearam seus frutos.
Precisava vê-lo... e fui. Estava deitado, assustei-me com o seu tamanho, estava sendo serrado em pedaços, nem sei para o quê seria aproveitado, mas, acariciei seu tronco num gesto de despedida e gratidão... Jamais imaginando que esse seria o seu fim... Nada justo. O progresso, com a sua velocidade cada dia maior, tinha que escolher um mártir e lá se foi o meu pé de cajamanga.

* Cantor e compositor

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