domingo, 25 de setembro de 2011

O enterro de João Nogueira

Queridos amigos este é meu texto desta sexta feira para o Jornal Tribuna, como sempre com uma pitada de humor.
Bom fim de semana, boa leitura e tomara que chova.
Buenão.


O enterro de João Nogueira


* Bueno
buenocantor@terra.com.br
www.buenocantor.blogspot.com

Estava a procura de um tema para desenvolver meu texto desta semana, e não achava nada para escrever da forma que gosto, descontraída, meio que sem compromisso, enfim, contando um causo. Remexendo em meus guardados, me aparece nas mãos um recorte de jornal de 2007. Eu sempre os guardo para pesquisas futuras, caso precise de inspiração ou informações... Nele, Sócrates dizia que sua relação com a morte era algo muito natural e que quando morresse, queria que seu corpo fosse cremado e suas cinzas colocadas em um barril de 50 litros de chope, para que seus amigos o bebessem e assim cada um ficaria com um pouco dele.
Já tinha ouvido Sócrates dizer isso muitas vezes. Certa noite, no Empório Brasília, que era praticamente nosso escritório, onde quase tudo se resolvia, estávamos fazendo um samba, e lembro dos que rodeavam a mesa: Magrão, eu, Kaxassa, Sarjeta e Tião do Violão. Magrão tornou a repetir seu desejo, e até brincando ameaçou de que se não o obedecessem, voltaria para nos cobrar.
Tião do Violão sempre foi meio medroso, já tava meio zoró quando retrucou, dizendo que ele não beberia chope com cinza, até porque deveria ter um gosto de carne queimada e ele detestava carne bem passada, além de que as cinzas de um corpo curtido no álcool por mais de 50 anos deveria ter um teor alcoólico altíssimo e poderia não lhe fazer bem.
Kaxassa mandou ver: “Você vai beber, sim, Tião. Imagina que de repente Magrão encarna na gente e viramos craques, podemos até montar um time e sair por aí jogando de calcanhar!!!. Cara, a gente ia faturar uma grana!!! Imagine, nosso time em campo, todos com a classe e categoria do Doutor, amigo!?!?!” Essa balançou Tião, que convencido pelo argumento de Kaxassa, topou beber chope com as cinzas do Magrão, que de sua cadeira morria de rir.
Sarjeta, que até então nada havia falado, degustava uma genuína Salinas lá da sua Minas Gerais, e empolgado com o papo, colocou aquele pequenino copo sobre a mesa e de imediato passou a mão no celular, convocando Marcelo da Cervejaria Colorado para importante reunião na qual ele deveria fazer a tal química chope versus cinza e colocar tudo num barril.
Só sei que no dia seguinte ninguém lembrava da tal reunião. O tempo passou e sempre lembrávamos daquela memorável noite. Hoje nosso Doutor, em decorrência da bebida, está hospitalizado (saiu ontem) e recuperando-se, estamos torcendo muito por ele e aqui vai meu conselho pra quem exagera no birinaite. Manerem, meus amigos, sim, desfrutem de muitas “geladas” com prazer, mas sempre com muita responsabilidade e cuidados.
Mas, pegando gancho no causo acima, escrevo agora sobre a partida de meu ídolo, o sambista João Nogueira, e que cujo desejo, ao morrer, era ter seu corpo cremado e suas cinzas jogadas em um lugar da capital carioca. Seu filho Diogo Nogueira, que se revelou um sambista de primeira, disse no programa do Raul Gil que ao jogar as cinzas do pai, muito emocionado, pegou um pouco e passou nos braços e corpo para que ficassem nele impregnadas.
O velório foi numa pequena capela do cemitério São João Batista, no Rio de Janeiro, e sobre seu caixão repousavam as bandeiras do Flamengo e da Portela, suas grandes paixões. Em volta, misturados a muita gente anônima, estavam amigos do samba e da boemia, como Zeca Pagodinho, Moacyr Luz, Guilherme de Brito, Nelson Sargento, Alcione, Beth Carvalho, Lecy Brandão – vez ou outra iam ao quiosque lá fora tomar os trezentos litros de chope e cerveja,especialmente encomendados pela esposa do finado, era outro desejo de João Nogueira que queria só alegria em seu velório.
No cemitério, a esposa Ângela ainda levou um litro de uísque e só um copo longo, os mais próximos bebiam e cantavam seus sambas. Um fato cômico aconteceu e foi contado no velório por Luiz Ayrão, que era sempre confundido com João Nogueira, fato que deixava o sambista uma fera. Luiz Ayrão estava indo para o velório de João quando fez um retorno proibido, o guarda o parou e ao reconhecê-lo, disse: “Tudo bem... Desta vez passa... Mas logo o senhor, hein, seu João Nogueira???
Parodiando a campanha, se beber não dirija, digo: Se quiser viver mais, beba menos.

* Cantor e compositor

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