sábado, 17 de dezembro de 2011

Sócrates, Fagner, a música e a bola


 
* Bueno
buenocantor@terra.com.br
www.buenocantor.blogspot.com

Raimundo Fagner nasceu em Orós, no Ceará, cidade que tinha uma das mais belas represas do país. Conhecida como represa de Orós, ela passou por um período de seca muito extenso. Quase chegou a secar por completo. Mas a fé do nordestino daquela terra fez com que a chuva chegasse, revertendo a situação e mandando água sem parar. Foi tanta chuva que a represa estourou, inundando o sertão cearense.
Daí nasceu uma linda canção composta por Gordurinha e Nelinho: Súplica Cearense, que é uma poesia! “Oh! Deus perdoe esse pobre coitado que de joelhos rezou um bocado pedindo prá chuva cair sem parar...”
Fagner, quando criança, sonhava em ser jogador de futebol. Numa de nossas rodas de prosa, ele contou que não deu para a coisa, mas que chegou até a montar um time em Fortaleza cujo nome era Beleza Futebol Clube, tenho foto desta época. Só sei que o esporte está sempre presente em sua vida, praticando-o até hoje com certa habilidade, pois, eu já pude testemunhar!
O futebol perdeu um craque, mas a música ganhou um cantor e letrista de primeira categoria! Fagner em sua juventude participou de conjuntos musicais.
O destino o fez mudar para Brasília. Foi estudar arquitetura na Universidade Federal, onde estudava outro jovem músico cearense, também envolvido com a música apenas como hobby, até então. Esse cabra era nada mais, nada menos que Belchior, um dos maiores compositores brasileiros.
Em 1970 rolou nessa Universidade um grande festival de música popular brasileira. Fagner e Belchior, aí já totalmente envolvidos com a arte de compor decidiram inscrever no concurso uma de suas composições. Era Mucuripe. “... calça nova de riscado, paletó de linho branco, que até no mês passado lá no campo inda era flor...”
Foi a grande vencedora, e que tempos depois, seria grande sucesso na voz de muitos artistas como Roberto Carlos, Elis Regina, Djavan e muitos outros.
Música e futebol sempre andaram de mãos dadas e Fagner batia sempre uma bolinha com grandes astros da MPB: Chico Buarque, Carlinhos Vergueiro, Zico, Sócrates e foi através do Magrão que,conheci Fagner.
Numa das vindas dele para Ribeirão Preto, tive o privilégio de compartilhar bons momentos na casa de Sócrates. Foi numa dessas tardes de longos papos que ele me disse: “Buenão, sabe qual foi o dia mais feliz da minha vida?” Eu respondi; “Não... Conta aí meu velho”. E Fagner contou: “Em 1982, o Reinaldo, jogador do Atlético Mineiro, armou um jogo beneficente no Estádio Centenário, velho estádio do América Mineiro que seria veteranos do Galo contra alguns artistas”. O Fagner convocou para a partida ele mesmo, Chico Buarque, Vagner Tiso, Vinícius Cantuária, Gonzaguinha, João Nogueira, Carlinhos Vergueiro, entre outros astros e levou o Sócrates de reforço, naquela época, Magrão estava no auge de sua carreira.
O Centenário lotou. Os times entraram em campo. A torcida feminina era maioria, claro, para ver os astros da MPB, principalmente Chico Buarque. Quando Fagner viu em campo o time adversário logo falou:  “Magrão, o Rei (apelido de Reinaldo) nos enganou, esse é o time titular do Atlético e não veteranos!!!”
Na verdade, os profissionais queriam ter história pra contar, jogar com Chico, imagine... Foi quando o Sócrates falou: “Não esquenta a cabeça, Fagner. Fica lá na frente que vou te enfiar umas bolas de três dedos e você só vai tocando pra dentro”. Começa o jogo. De cara o Atlético faz 1 a 0 e Fagner estrilou. “Não te falei, Magrão, vamos tomar de goleada!”
Sócrates, talentoso e confiante, repetiu: “Fica lá na frente que vou te deixar na cara do gol”. E cumpriu o prometido numa jogada genial. Fagner empatou a partida. A torcida se inflamou. Fagner subiu no alambrado vibrando como criança, lembro-me de ter visto essa cena na TV.
Segue o jogo, no segundo tempo mais uma enfiada de Sócrates e Fagner marca o segundo gol!! Outra vez aquela loucura e a bola rola... Faltando 15 minutos para acabar o jogo, Chico estava na grande área e, depois de um toque genial de Sócrates, fez 3 a 1.
A torcida foi à loucura, invadiu o campo, colocou os astros nos ombros, encerrando ali o jogo. Depois, é claro, uma comemoração à altura daquele “show de bola”: um grande churrasco regado a chope e muita conversa boa uniu ainda mais a música e o futebol. Vejam vocês, Fagner acostumado a grandes espetáculos, considerou aquele momento o mais feliz de sua vida!  A felicidade, às vezes, encontramos nas coisas mais simples da vida.

* Cantor e compositor

Nenhum comentário:

Postar um comentário