sábado, 29 de outubro de 2011

A vergonha é a herança maior que meu pai me deixou!

Essa frase magnífica, verdadeira, atual e muitos adjetivos mais, é do grande compositor e poeta Lupicinio Rodrigues. A partir dela é possível escrever um livro, dela dá pra lembrarmos fatos acontecidos e que nos chegam em mesas de bar, em bate-papos boêmios e aqui vou lembrar alguns.

A frase titulo é do samba canção Vingança, de Lupicinio Rodrigues, cujo apelido era Lupa. Lupicinio, também conhecido como o "rei da dor de cotovelo" pela forma com que descrevia o desamor, o fim de caso. O termo "dor de cotovelo" nasceu da situação em que o sujeito levava um fora da amada e se aninhava em um bar qualquer para afogar suas mágoas, e ali colocava o cotovelo sobre o balcão e enchia a cara até a cabeça ficar mais pesada que o corpo. Pra segurar tamanho peso, o coitado do cotovelo pagava o pato, amigo.

A vergonha é a herança maior que meu pai me deixou!!! No caso do Lupicinio, ele retrata uma cena ocorrida em um bar em que a mulher, arrependida por ter traído, se entrega ao birinaite.

A palavra "vergonha" é tão forte que muitas vezes evito empregá-la numa discussão, ou quando me altero, o que é muito difícil. Parodiando o velho Lupa, digo que o nome que herdamos de nossos pais também é a herança maior deixada por eles. Eu, menino, pouco entendia, mas lembro-me de quando meu pai, Rosemiro Bueno, maquinista da Companhia Mogiana de Estradas de Ferro, o velho Rói - este era seu apelido de mocidade -, tinha o costume de dizer que era do tempo em que a garantia maior de qualquer negócio era um fio de bigode, nada tinha maior credibilidade. Outra coisa: quando assinava um documento, o fazia com o maior orgulho, ele tinha um prazer indescritível ao escrever num papel seu nome, seu chamego, e se estava perto me indicava o escrito e dizia: "Meu filho, a maior fortuna que vou te deixar é meu nome, honre-o". Olhava seu rosto, seus olhos brilhavam e seu semblante transmitia algo que hoje sei o que significa quando digo para meus filhos e meu neto o que dele ouvia. Meu pai criou seis filhos honrados.

Você que hoje lê meu texto já deve ter ouvido muitas vezes a frase: "Fulano morreu foi de vergonha". Vou aqui contar um fato em que um pai morreu de vergonha. Sou amigo de vários artistas, alguns próximos, outros vejo na correria do dia a dia. Recentemente, tomei conhecimento de que um grande amigo e cantor havia perdido seu irmão, que era mais velho que ele quatro anos, só não sabia porque.

Dia destes, numa roda de prosas, entrou este assunto e então tomei conhecimento do motivo. Após muitos anos de sucesso, muitos shows pelo nosso Brasilsão, o cantor, um tanto que cansado, resolveu colocar um pouco o pé no freio, fazendo apenas apresentações esporádicas, recolhendo-se em sua cidade, de papo pro ar, obedecendo a um conselho da nossa Rita Lee na sua música Mania de você: "Nada melhor do que não fazer nada..."

E nesse não fazer nada, percebeu que suas finanças estavam minguando, amigo. Ao dar uma geral, descobriu que a quantia que havia amealhado durante a carreira e que poderia ficar no sossego, havia sido surrupiada e sabe por quem? Seu sobrinho... Isso mesmo, o sobrinho dele. Era ele quem cuidava da parte financeira da carreira do tio, era filho de seu irmão descrito acima e pelo qual o cantor tinha o maior respeito.

Resultado: com o caixa quase que a zero, meu amigo juntou seus fiéis músicos e colocou outra vez o pé na estrada. Seu irmão, ao tomar conhecimento das falcatruas do filho para com o tio artista - aí entra a palavra "vergonha" -, morreu de vergonha, após definhar por algum tempo. Fico imaginando as pessoas do entorno da família o que pensam, sinto pena.

Casos como este ou quase que igual está por ai aos montes bas¬ta estarmos informados. Vou seguindo minha vida cumprindo os ensinamentos do meu velho pai, tropeçando, caindo, levan¬tando e cantando e sempre que canto Vingança me vem na cabeça à frase: "A vergonha é a herança maior que meu pai me deixou.

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