sexta-feira, 7 de outubro de 2011

Histórias sobre Ary Barroso

Queridos amigos, neste meu texto desta sexta feira para o Jornal Tribuna, rebusquei na gaveta da minha minha memória algumas histórias sobre Ary Barroso.
Bom fim de semana e uma boa leitura.
Buenão.






Histórias sobre Ary Barroso

* Bueno
buenocantor@terra.com.br
www.buenocantor.blogspot.com

Você já ouviu falar de Ary Barroso??? Se não ouviu, então, vou te dar uma força, pois na certa você já escutou ou cantarolou muitas músicas suas como Aquarela do BrasilNa baixa do sapateiroIsso aqui o que éCamisa Amarela e muitas outras riquezas da MPB vindas da “cachola” de Ary Barroso.
Faz algum tempo eu fui cantar em Minas Gerais e quando passava em frente a cidade de Ubá comentei com meus músicos: “Aqui nasceu Ary Barroso”. Daí passei a contar causus sobre o velho compositor que ficou órfão aos oito anos e foi criado pela avó, com quem aprendeu a tocar piano. Já moço, foi para o Rio de Janeiro estudar direito e, para se manter, fazia  de tudo um pouco. Era época de cinema mudo e ele tocava seu piano no cinema. De acordo com a cena, animava o filme, fazia o galope do cavalo ou os adoráveis tombos de Charles Chaplin.
Ary gostava de tomar uns gorós e logo se enturmou com o pessoal da zona boêmia carioca, onde misturavam-se artistas, compositores, radialistas, jogadores de futebol e cantores. Ele era Flamengo roxo e como locutor esportivo, quando ia transmitir jogos do seu Mengo e o adversário fazia um gol, ele ficava uma fera e não gritava gol, mas quando o gol era do Mengo ele virava torcedor. Ary Barroso era dono de um mau humor irritante. Numa época em que nem se ouvia falar em televisão, o rádio era o bambambam. Ary tinha um famoso programa de calouros onde não admitia o cara falar o nome da música e não saber os seus autores. Ele era tão cricri que, certa vez, uma jovem foi cantar Se todos fossem iguais a você, de Tom Jobim e Vinicius de Morais, e o exigente Ary perguntou para a moça de quem era a música. E ela, temerosa, disse: “É do Vinicius de Morais...” Ary torceu o bigode e falou na bucha: “E o Tom, minha filha??? Cadê o Tom???” Ela sem nada entender respondeu: “O tom é lá menor...” Essa foi o fim para o velho que subiu nas tamancas. Foi ele o descobridor de Elsa Soares, que foi sua caloura.
Ary Barroso era apaixonado por samba e seus amigos diziam que ele fez um pedido para ser escrito como epitáfio na lápide de seu túmulo: “Aqui jaz um cara que detestava jazz”
Ary morava na periferia do Rio, e perto de sua casa tinha uma coisa que ele adorava, um “bar”. Certo sábado à tarde ele estava ali, bebericando, quando sua filha veio lhe chamar para ir até sua casa conhecer seu namorado, que foi lhe pedir em namoro. Ary disse a ela: “Fala para ele vir aqui”, e a filha, meio que sem jeito, falou: “Papai, ele não gosta de bar e não bebe e não fuma...” Ary tirou o chapéu da cabeça, colocou sobre o balcão, passou a mão no rosto e respondeu pra moça: “Olha aqui, minha filha, se esse rapaz não gosta de bar, não bebe e não fuma, não serve pra ser meu genro!!!”
Tem uma história incrível – entre tantas – contada pelo Ary. Certa noite ele estava em um bar no Leme, ao pé do chope, com Luís Jatobá e Fernando Lobo, pai de Edu Lobo, quando um sujeito apareceu com uns versos: “Moço, sei que o senhor toca piano e compõe, será que o senhor pode musicar esses versos aqui? Pago pouco, mas pago”.
Ary olhou os versos, nada entendeu e tacou uma música em cima, o cara gostou e disse: “Essa música será hino de uma dissidência de um terreiro de macumba”. Ary não gostou, mas deixou rolar.
A partir daí sua vida só deu pra traz, não compunha mais, nada o inspirava, o trabalho escasseou, até que recebeu uma carta anônima dizendo que em vários terreiros de macumba da cidade e do resto do Brasil estavam fazendo trabalho contra o autor do tal hino. Na mesma carta dizia para que ele procurasse uma velha mãe de santo em Niterói que ela poderia desfazer o mal.
Ary não deu bola e sua vida continuava no maior fubá, estava afundando cada vez, até que um dia decidiu: tomou a balsa, desembarcou em Niterói, a velha o recebeu e muito dócil o mandou tirar a roupa, porque seu negócio era feio. Deu-lhe um banho de estranhas ervas que a água da enorme bacia, que antes era clara, ficou escura, pastosa, cheia de miasmas e coisas ruins que haviam saído.
A velha senhora nada lhe cobrou e lhe disse; “Pode ir, meu filho, você não tem mais nada”. Ary Barroso tomou a balsa de volta ao Rio, já se sentindo outro cara, sentou no piano e logo compôs uma marchinha, o carnaval estava chegando, o sucesso tocou-lhe os ombros e nunca mais o abandonou.

* Cantor e compositor

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