domingo, 28 de agosto de 2011

Antonio Carlos e Jocafi


* Bueno
buenocantor@terra.com.br
www.buenocantor.blogspot.com

Sabe aquele dia em que a você acorda com uma música martelando na sua cabeça, ás vezes um grande sucesso das antigas (ou de hoje) e ela te acompanha em tudo que é canto? Eescovando os dentes a gente a canta, no chuveiro, então, soltamos o gogó sem dó, no carro, no trabalho a gente se pega cantarolando a tal canção...
Pois é, dia destes aconteceu outra vez comigo. Logo de manhã, me vi cantando As minhas coisas, música de Odair José, e quando a cantava no meu trabalho, meu amigo Wilson logo matou: “Buenão, essa é do Odair José”. E eu lhe respondi: “Na mosca, amigo”, mas o Fernando logo entrou no papo dizendo: “Mas esse cara é muito brega”. Daí, pensei: “Lá vem polêmica!!!” Fui-lhe perguntando: “O que é brega pra você, Fernando?”  Disse ele: “Ora, as letras das músicas, a própria melodia desse cara é brega”. Bom, preferi deixar o papo rolar, porque vi que não ia dar acordo, até porque Odair José faz parte da galera dos anos 60, hoje considerada brega.
Tem um programa no SBT, é de calouros, se não me engano chama-se Ídolos, que tem quatro jurados. Eles são um show à parte, sem dúvida! Um dia destes, uma jovem foi se apresentar e um deles pediu para ela cantar uma música de Taiguara. Ela, sem vacilar, torceu o nariz dizendo que Taiguara era brega. Meus amigos, os caras ficaram umas feras e depois de um qui­pro­quó danado pediram para ela se retirar, dizendo: “Caram­ba!!! Dizer que Taiguara é brega não dá”.
Temos, nos dias de hoje, um artista que tira a maior onda com sua pinta de brega: Falcão, um nordestino simpático, muito alto, meio desconjuntado, e a cada dia se apresenta com um paletó de cores “bem cheguei”. Na lapela, um tremendo girassol, um relógio amarrado e o numero de seu celular bem grande, para não ter que ficar repetindo. E olha que ele é arquiteto e vem de família abastada de Fortaleza.
Pra mim, mais brega que a banda Calypso não há nada atualmente, e pelo andar da carruagem parece que tomaram doril... Ser brega ou estar brega talvez até seja um estado de espírito, tipo: você resolve vestir tal roupa que há tempos estava guardada e sua esposa fala que não lhe caiu bem, que está meio fora de moda e coisa e tal. Nessa aí, com sutileza ela está te chamando de brega e por aí vai...
Outro dia cheguei na Secretaria da Cultura, onde trabalho, cantando o antigo samba Toró de lágrimas, dos meus amigos Antonio Carlos e Jocafi, e ao cruzar com o Picasso, sambista de carteirinha e que também trabalha lá, ele disse: “Buenão, esses caras são muito bregas!!!” Puxei o freio de mão e devolvi... “Mas como brega, Picasso, se esse samba tem mais de trinta anos e os caras colocaram na letra ‘Foi um amor programado por computador’, isso naquela época”... Ora, não posso concordar com meu grande amigo pagodeiro e o convenci de seu engano.
Antonio Carlos e Jocafi fizeram muito sucesso na década de 70 e aconteceu com eles o mesmo que ocorreu com a maioria dos artistas daquela época. Rádios dificilmente tocavam suas músicas, caíram no esquecimento, partindo então para shows e assim apenas os saudosistas como eu poderiam aplaudi-los.
Conheci Antonio Carlos e Jocafi através de meu grande amigo e músico Paulo Lakimé, na época dono do Bar Villa-Lobos. Além de dono do bar, Paulo viajava o Brasil como pianista deles. Eu e Sócrates fomos ao show deles no Villa-Lobos. Depois do show, marcamos de se encontrar na casa do Magrão, às duas da tarde do dia seguinte. Almoço, muito bate-papo e cantoria de qualidade. Claro que foi inesquecível!! Eles contaram cada história que levarei na lembrança para sempre, falaram de seus encontros com o escritor Jorge Amado, falaram muito do Rio São Francisco – que o povo nordestino ama com loucura –, contaram que todos os meses recebiam direitos autorais dos Estados Unidos pela gravação de Você Abusou pelo Steve Wonder, recebiam também da França e Espanha por usarem a mesma música em comerciais.
Entre causos e cantorias, invadimos a noite selando assim uma amizade que dura até hoje. Por essas e muitas outras, meu amigo Picasso, digo: Antonio Carlos e Jocafi não são bregas, não!

* Cantor e compositor

quinta-feira, 25 de agosto de 2011


Domingo,  Sócrates será homenageado pelo clube que revelou para o mundo!!!
Esta faixa, estará circulando no estadio Santa Cruz.

sábado, 20 de agosto de 2011

A rua mais bonita do mundo....em Porto Alegre???‏

http://goncalodecarvalho.blogspot.com/

Ao abrir esse e-mail, senti uma pontinha de inveja dos Porto-alegrenses, em ver que em minha cidade, a devassa de árvores é absurda, pela simples preguiça de fazer um ótimo exercício que é varrer.
Buenão.
Repassando
Gente...
nessas de passar o frio & a hora, brinquei com a procura no Google:
A rua mais bonita do mundo!
Pra minha grata surpresa uma rua aqui de Porto Alegre
está na lista & bem cotada <> achei o máximo !
Realmente é linda:
Eis a rua Gonçalo de Carvalho <> bairro Independencia <> Poa = R.G.S





A rua mais bonita do mundo....















A boemia esta doente!!!


* Bueno
buenocantor@terra.com.br
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Semana passada fui surpreendido por duas notícias que me deixaram um tanto que aborrecido. A primeira era de que Caburé, boêmio de carteirinha, havia amputado alguns dedos do pé. Logo ele, que canta como um rouxinol e toca um violão com talento raro. É do tempo em que se usava dedeira no polegar direito, de onde, ao tocar os bordões, o som das cordas sai com uma nitidez impressionante.
Carlão é contemporâneo de Caburé e os dois sempre foram grandes amigos. É queridíssimo no ramo gastronômico, trabalhou em tudo que é canto da cidade, e onde montava um bar, atrás ia uma legião de amigos. Todos sabiam que, onde Carlão estivesse, comia-se bem. E dá-lhe caldo de mocotó, joelho de porco, feijoada, peixe grelhado... Pôxa, só de escrever me dá água na boca...
Carlão e Toninho abriram um bar na rua Amadeu Amaral com Floriano Peixoto, e até ganharam ano passado o primeiro lugar no famoso concurso Comida di Buteco – neste ano foram premiados com o segundo lugar. Carlão, tal qual Caburé, também foi pego de surpresa pelo mesmo mal, essa tal de diabetes. Êita, mas que doencinha traiçoeira, silenciosa... É mais uma dessas "doenças modernas" que nos impede de saborear uma pá de coisas que gostamos como: pão, bolo, bolacha à noite (pois vira açúcar)...
Pôxa, pizza vira açúcar, até a cerveja contém açúcar. Tô frito, amigo! Pois bem, deu um monte de coisas no querido Carlão: fez safena, precisou amputar uma perna, estava internado, nem visita podia receber.
Lembrei-me de quando o presidente João Batista Figueiredo esteve aqui em Ribeirão Preto, foi lhe oferecido um jantar e ele perguntou se tinha algum cantor de seresta na cidade. Então, lembraram de Caburé, que na época era policial militar. Naquele dia ele estava trabalhando. Resultado: mandaram tirar Caburé da escala e ele chegou no Black Stream com a maior pinta de artista de renome. Caburé deixou o presidente encantado. Figueiredo gostou tanto dele que por vários fins de semana mandava um jatinho da Presidência buscar nosso cantor para cantar na Granja do Torto, em Brasília.
Caburé teve vários bares na cidade, mas, sempre falia porque não cobrava dos boêmios e músicos, enfim, não sabia administrar, não nasceu para isso. O último bar que possuiu colocou o nome de A volta do boêmio, ficava na Américo Brasiliense com a Marcondes Salgado, em frente à lotérica e bar Jóquei.
Caburé me contou que, certa vez, cantando em uma mesa de bar, tomando cerveja sem compromisso, viu ao lado um senhor que tudo ouvia e adorava, foi quando arriscou e pediu a Caburé para cantar algumas músicas. E o nosso cantor, é claro, mandou ver, fazendo o cara chorar de emoção, pois era época natalina e antes de ir embora o ouvinte colocou no bolso da camisa de Caburé um cheque dobrado e disse: "Você com sua voz maravilhosa e suas canções me fizeram voltar a uma etapa muito feliz da minha vida, este é um presente para que você tenha um feliz Natal com sua família".
Caburé foi até o banheiro louco para ver o valor do cheque e levou o maior susto, amigo, pois, o valor dava pra comprar um carro zero na época. Ele saiu correndo e o cidadão já estava de saída. Caburé disse achar que o valor estava errado, era muito alto e o cidadão disse: "Não é não, é esse o valor, você me fez feliz, merece muito mais"
Na segunda-feira seguinte, Caburé foi fardado descontar o cheque, mas como o valor era muito alto, foi a maior correria entre os gerentes do banco. Por fim, ele saiu com aquele monte de dinheiro, em vários sacos de papel de pão, jogou tudo dentro de seu fusquinha e saiu pela cidade de bar em bar – o vento até jogava algumas notas pela janelinha. Aí bateu a tal de preocupação: "Que fazer com essa grana??? Nunca vi tanto dinheiro!!!" Anoiteceu e ele tomou uma decisão: Foi até a estação rodoviária e distribuiu uma dinheirama entre os mendigos que dormiam sob a marquise. Ato seguinte: foi para uma chácara de prostituição e ali perguntava para as mulheres: "Como você entrou nessa vida???" Elas contavam suas histórias e ele ia distribuindo o dinheiro, acabando com o resto ali mesmo. Saiu de lá como sempre viveu. Aí está um pouco das histórias desses dois grandes boêmios e meu desejo de que eles dêem a volta por cima.
* Cantor e compositor

sexta-feira, 12 de agosto de 2011

O retrato do velho



* Bueno
buenocantor@terra.com.br
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Sempre que se aproximam datas significativas, como a de domingo próximo, Dia dos Pais, fico pensando em uma maneira de manter sempre acesa a lembrança da presença de meu pai, que foi embora tão cedo e nem conheceu Lucas, meu filho mais novo, mas ele está sempre em minhas orações, muitas vezes chego até a sentir seus afagos. Roi, era assim que era conhecido meu querido pai e não descobri porque ele tinha esse apelido, já que se chamava Rosemiro Bueno, não vejo aí nada que justifique o meu querido “Roi”, mas, enfim... Quem pode com os apelidos, ainda mais quando se tornam fortes e mais carinhosos com o tempo...
Raimundo Vieira de Oliveira, assim se chamava o pai de Sócrates, todos tinham por ele o maior respeito e o chamavam de Seu Vieira, e o Magrão quando se referia a ele dizia “Vieirão”.
Rosemiro Bueno, maquinista da Mogiana, guiando aquela enorme serpente de ferro, carregava o Brasil sobre os trilhos. A vida lhe deu de presente uma esposa com o nome da mais linda das flores: Rosa, minha adorada e maravilhosa mãe, dedi­ca­da, guerreira e juntos foram abençoados com seis filhos.
Raimundo Vieira de Oliveira, fiscal de renda, era temido por todos que queriam fazer uso da Lei de Gerson. Com a dona Guiomar, sua esposa fantástica, juntos também tiveram seis filhos.
Cantei por dezesseis anos no restaurante Ponto Chic, e, em  certa noite, aparece por lá o camisa oito do Botafogo, do Corinthians e da Seleção Brasileira: sim, era o Sócrates!!! Eu nem acreditava, a honra dele estar ali, onde eu cantava, era muito grande. Fui agradecer sua presença, embora sentisse um misto de receio e timidez ao me aproximar, até que me enchi de coragem e lá fui eu... Magrão foi de uma simplicidade sem limite, deixou-me à vontade, até me pediu para cantar Espelho, gravada por João Nogueira, e ele sequer sabia que essa era a música que eu mais gostava de cantar.
Espelho, cuja melodia é de João Nogueira e letra do Paulo César Pinheiro, foi composta em homenagem ao pai de João, que foi embora muito cedo também, quando ele tinha apenas nove anos. Certa noite, vendo TV, o entrevistado era Paulo César Pinheiro. Foi quando o repórter lhe perguntou como ele fez a letra deEspelho, e o poeta, emocionado disse: “O João me pediu para fazer a letra para seu pai, mas a escrevi como se fosse para o meu”. E chorou um bocado ao lembrar do pai... Confesso que não tinha entendido essa do poeta.
Sócrates e eu nos tornamos amigos. Uma noite, em um bar, quando assistíamos a um show de Cássio Sales (cover do Tim Maia), percebi que Magrão escrevia poesias em guardanapos. Avisou que estava inspirado, foi quando lhe pedi para colocar letras em músicas minhas e ele encarou. Entre sambas, toadas, baiões e baladas, fizemos mais de 50 até hoje...
Querendo homenagear meu pai, compus uma toada e fui pedir ao Doutor para letrar. Ele me perguntou se eu já tinha algum tema, e respondi: “Meu Pai!” Descrevi para ele um retrato na parede da casa de minha irmã Ruth, com meu pai na janela de uma Maria Fumaça.
O tempo passava e ele não achava uma linha para começar a escrever a letra. Certa noite eu cantava no Ponto Chic, Magrão chegou e percebi que ele estava muito feliz. Até disse: “Buenão, hoje eu vou fazer a letra do seu pai”. Saímos do restaurante por volta de uma e meia da madrugada, fomos para minha casa. Eu cantarolava a melodia e ele escrevia frase por frase, isso dezenas de vezes, ia e voltava, rabiscava, rasgava folhas, só sei que o dia amanheceu, com o sol de verão nos dizendo bom dia, que naquela manhã brilhava como nunca. Já passava das seis e, depois de muitas cervejas, debaixo da mesa uma montanha de folhas amassadas, foi quando ele passou a régua na letra e finalizou: “Tá pronta, cante agora inteirinha”. E eu cantei, ficou linda, choramos muito, emocionado ele ainda falou: “Aí está ‘O retrato do velho’, e seu pai está aqui com a gente”. Fiquei arrepiado e chorei mais ainda.
Maurício e Marcelo e Sócrates a gravaram. Convidados por Inezita Barroso, foram participar do programa Viola Minha, Viola, na TV Cultura. Quando acabaram de cantar, Sócrates, em lágrimas, disse ter feito a letra para seu pai e que a estava cantando pela primeira vez depois que seu Vieira partiu. Naquele momento consegui entender, então, os poetas Paulo César Pinheiro e Sócrates Brasileiro Vieira de Souza Oliveira.
Para os Buenos, os Vieiras, os Pinheiros, os Nogueiras... e para todos os papais do mundo, o meu mais sincero desejo de viverem “um feliz Dia dos Pais”!!!

* Cantor e compositor


Música O retrato do velho - Nas vozes de Mauricio, Marcelo e Sócrates
e foto da Maria Fumaça com meu pai no comando.



sábado, 6 de agosto de 2011

Banda 70's Company - No Canta Ribeirão

CASSIO MAYA " TIM MAIA COVER " E BANDA STA VICTÓRIA DE RIBEIRÃO PRETO -SP

De Tabela

Meus amigos,
Meu amigo, José Neumanne Pinto, jornalista, poeta e escritor, em seu poema "De Tabela" presta justa homenagem a dois gênios da bola, Sócrates e Zico,  cuja seleção de 82 que muito embora não tenha ganho o caneco ninguém a esquece.
Boa leitura.
Buenão.


De tabela

José Nêumanne Pinto

Sócrates bebe a bola
como a cicuta:
um gesto fatal.

Já Zico a vê
como o destino:
amplo e franzino.

Em ambos sobra a arte
de Gal Costa ao chutar um agudo
e de Benny Carter agarrando o sax.

Zico despe a dez
como um estigma
e a nota.

Sócrates veste a oito
como um fantasma
e a multiplica.

A ambos ocorre o sentimento
de Amelinha ao inspirar “Frevo Mulher”
e do almuadem Fagner que berra aboios.

Sócrates escoiceia a bola
como a perna fosse foice,
alavanca de mover o mundo.

E Zico a engole fundo
na távola redonda,
com fome do mundo.

De ambos fica a sabedoria
de a saber no prumo porque torta
e de caber na rima porque gorda.

Conforme Zico, o tempo da bola
emerge do passado, some no futuro
e é só presente.

No tiro de Sócrates,
o espaço entre a bola e a malha
não o mede a vã filosofia.

Para ambos, não é segredo
se Zé Ramalho administra o apocalipse
e Roberto Carlos repropõe “Ternura antiga”.

Brasileiro e Oliveira,
a grama é céu pra lua
de seresta e baile.

Coimbra e Antunes,
pássaro sem asa,
carrasco na vítima.

Com ambos vêm paramentos
que vertem a paixão do povo
em vinho de missa.

A espora de Zico
na ponta da bota
prolonga o urro da multidão.

O bisturi de Sócrates
é seu calcanhar de Aquiles
forrado de unguentos.

Por ambos espalham-se as bênçãos e cantos
como Bob Dylan é limo da pedra que rola
e John Lennon se assassina na própria luz.

Sócrates tem manobras
de espadachim,
o quinto dos três mosqueteiros.

Zico doma o jogo
como Stendhal:
com luto e fúria.

Só a ambos o gol sempre revela
o lugar imponderável
do encontro das paralelas.

(Solos do Silêncio: poesia reunida, Geração Editorial, São Paulo, 2002)

sexta-feira, 5 de agosto de 2011

Roubaram a mulher do Noel


* Bueno
buenocantor@terra.com.br

Quem não se lembra de um antigo dito popular: “Sempre que surgia um palhaço no picadeiro, de qualquer circo armado, em qualquer canto deste nosso Brasilsão, ele mesmo gritava com sua voz estridente, mas cômica: ‘E o palhaço,. o que é???’”. E a plateia, num só coro, respondia: “É ladrão de ‘muié’!!!” E o riso estampava no rosto de todos, principalmente de nossas crianças.
Quem me conhece sabe o quanto gosto de contar causos, principalmente do que rola no meio da música popular brasileira. Confesso que tenho uma pontinha de inveja de quem viveu décadas atrás, onde o malandro tinha até certo trânsito em rodas de prosa, contando ali suas peripécias, sem com isso despertar ódio das pessoas. Ah!, esse era o bom malandro, alguns até o admiravam, tempo em que se vivia uma boemia sadia e cheia de inspirações, enfim, tempos de Noel Rosa.
Um contemporâneo de Noel, também de sacadas geniais, era Nelson Cavaquinho, que ganhou esse apelido porque, por onde ia, lá estava com seu fiel cavaquinho. Era um boêmio queridíssimo, daqueles de sair de casa para comprar leite na padaria e voltar dali a uma semana. Seu pai era sargento da Polícia Militar carioca, e como naquela época para ser PM não se exigia muitas virtudes, seu velho deu uma ajeitada e lá foi Nelson assentar praça na Cavalaria. Montado em seu companheiro, revólver na cintura, cavaquinho no ombro, ia patrulhando os morros do Rio de Janeiro. E sabe como é, nos morros existiam dezenas de “vendinhas”, onde o produto mais procurado era a cachaça. Nelson não resistia, descia do cavalo, empunhava seu cavaquinho, cantava seus sambas e de cachaça em cachaça acabava ficando de pileque. Seu cavalo, conhecedor “décor” do caminho, acabava por voltar sozinho para o quartel. Resultado: como ele não tomava jeito, acabou sendo expulso da PM.
Acho que o causo campeão sobre Nelson Cavaquinho é aquele em que ele, certa noite, acordou lá pela meia-noite super­as­sustado, pois estava tendo um pesadelo: sonhava que ia morrer às 3 da manhã. E quem disse que ele dormiu o resto da noite??? Nelson Cavaquinho, medroso como ele só, olhava o relógio e os ponteiros iam avançando, ele com os olhos arregalados como se tivesse tomado um choque, só de olho no lance, e quando faltavam 10 minutos para as três, ele tomou uma decisão “cavaquinhesta”: atrasou o relógio em duas horas e assim foi até o sol bater em sua janela. E ele a acreditar que “a sua hora de subir não tinha chegado”, para seu alívio e da MPB também!
Voltemos a Noel, que compôs sambas que parecem terem sido feitos recentemente, pra não dizer hoje. Um samba seu que gosto muito é Onde está a honestidade, isso tem mais de 70 anos. Lendo jornais e vendo TV ultimamente, sinto ver Noel rindo, tipo: “Olha eu aí...Nunca fui tão atual na minha escrita, amigo”.
Mas Noel, dois anos antes de morrer, produziu muito, até parecia perceber que seu tempo de validade estava se expirando, mesmo assim não deixava a boemia de lado. Quando seus dois pulmões foram atacados ferozmente pela tuberculose, resolveu ir para a casa de seus tios em Belo Horizonte, na esperança de que com a mudança de ares sua saúde arribasse. Nessa, precisou casar-se meio que forçado com Lindaura Martins, passando com ela quatro meses na capital mineira. Mas, como todo boêmio que se preza, Noel tinha uma amante, Ceci, que era de quem ele gostava com loucura. Ela trabalhava num cabaré da Lapa carioca.
Voltando de Belo Horizonte meio revigorado, mas não curado, correu a procurar por Ceci e, para sua surpresa, ela já estava de novo amor. E surpresa maior ainda, o novo amante era seu amigo  (mui amigo), o ator, cantor e compositor Mario Lago.
O romance entre Noel e Ceci começara numa noite de São João e saudosas lembranças começaram a povoar a cabeça do poeta da Vila Isabel, fazendo fluir sua veia musical. E ele compôs coisas lindas para sua amada, dessa ninhada saiu a joia Ultimo desejo, onde retrata sua história com Ceci. “Nosso amor que não esqueço, e que teve seu começo... Numa festa de São João... Morre hoje sem foguete... Sem recado e sem bilhete... Sem luar e sem violão...”  Quem a nunca ouviu ou nunca cantou essa maravilha não sabe o que está perdendo.

* Cantor e compositor