Bueno *
Dia desses, revisitando
as fotos que tenho no meu “face”, parei – saudoso – diante de uma em especial,
era de Zé da Conceição e seu sorriso largo – e olha que ele pouco sorria –, na
cabeça um chapéu de feltro, vestia paletó e segurava na mão esquerda um violão.
Olhando aquele instrumento em mágicas mãos, lembrei-me que, certa vez, eu
estava numa festa e Zé da Conceição era a atração musical.
Em festa sempre tem
aquele cara que quer dar uma canja, geralmente já tomou um monte e pouco está
se lixando se der algum vexame. E aconteceu. Um mala cismou de querer cantar e
tocar no violão de Zé da Conceição. Nosso músico morria de ciúmes de seu pinho,
também era de pouca conversa, mas falou pro sujeito: “No meu violão só eu toco,
se você quiser lhe acompanho, você pode cantar qualquer música”.
Mas o cara,
inconformado com a negativa do nosso músico, armou o maior furdúncio. Daí
pensei... “Isso vai dar barraco”. Antigos amigos do Zé da Conceição diziam que,
se fosse nos velhos tempos, quando ainda bebia, o cara já teria levado uns
catiripapos dos bons. Zé, com quase dois metros de altura, forte como um touro,
mãos que pareciam ser de tudo, menos de tocador de violão, quando ficava bravo
e com algumas doses de whisky na cabeça, deitava no chão um batalhão, mas na
época da festa ele estava pianinho.
A coisa acalmou e
Zé voltou a tocar. Daí o dono da festa, muito gentil e fã do grande músico,
veio se desculpar pelo seu convidado. Foi quando nosso artista lhe disse: “Este
violão, para pagá-lo, precisei passar muitas e muitas noites tocando sem levar
dinheiro algum pra casa, só eu sei o quanto me custou, veja que o cara está
chapado, se ele tropeça cai em cima do meu instrumento de trabalho e o quebra,
como fico eu???”
Vi muitas vezes com
que carinho e zelo ele tratava seu parceiro de música. A festa seguiu beleza.
Um dia assisti a uma apresentação dele no Sesc Ribeirão, quando acabou fui
abraçá-lo e ele disse: “Buenão, quero um chapéu seu de presente” Emendei: “Te
dou, sim, Zé”. Até disse a ele que gostava muito do tipo “panamá”, e ele
respondeu: “Pode ser este mesmo, Buenão, sabe como é... cavalo dado, não se
olha os dentes”. Perguntei: “Qual o seu numero???”
E ele: “Pode ser o
mesmo que o seu, vai dar certinho.” Percebi que Zé tinha um cabeção, mas fiquei
quieto, fui no velho Mercadão onde compro meus chapéus e comprei-lhe um 59, meu
número, ele provou e mal lhe cobriu o “cucoruco”, rimos muito e ele falou: “Nossa,
Buenão, não sabia que eu tinha este baita cabeção.”
“Coisas da vida,
Zé”, respondi. Depois ele foi lá na chapelaria, provou um monte e acabou saindo
com este chapéu de feltro que está na foto – uso este modelo no inverno.
Pereira, músico, foi tocar com Zé da Conceição no Sesc Bauru acompanhando uma
cantora. Chegando lá, ouviram de um grupo de jovens o seguinte comentário:
“Vamos embora que hoje vai ser pagode.”
Zé ouviu, ficou uma
fera e chamou os caras. Pegou seu violão e deu o maior show, tocou até
Beethoven, os caras ficaram de boca aberta, e Pereira completou: “Buenão, eu e
o Zé, dois ‘negão’, os caras acharam que ia virar pagode...”
Outra história do
Zé que Pereira conta e ri muito: Zé nunca tinha andado de escada rolante e
certa vez foi pra São Paulo de ônibus. Já na rodoviária, ele com a mala numa
das mãos e violão na outra, foi encarar a escada que leva todos ao andar
superior. Pereira disse que ele tinha medo e ficou um tempão ensaiando como
entrar na escada, até que levou um tranco do povo e lá foi ele suando em bicas
e encarando a inimiga.
Ao chegar lá em
cima, Zé colocou mala e o violão no chão pra respirar e enxugar seu suor, nem
percebeu que a escada não parava. Aquela multidão chegando e aquele baita homão
parado na saída, Zé levou aquele empurrão e lá foi violão, Zé e mala tudo
rolando pelo chão, e o povo caindo em cima... fco imaginando a cena...
Zé da Conceição.
Foi bom lembrar dele de uma forma alegre, tenho mais histórias deste querido
amigo e grande músico pra contar, mas fica pra próxima
*
Cantor e compositor
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